ESTATÍSTICA DIÁRIA

ADMIRADORES DAS IDEIAS

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

INFINITO APOGEU

INFINITO APOGEU

Olho nos olhos
Me sinto Narciso
No além paraíso
Dos meus olhos nos teus.

Olho nos olhos
No espelho te vejo
O ósculo desejo
Não posso, meu Deus!

Olho nos olhos
Espelho de ti
Retrato de mim
Infinito apogeu.

Olho nos olhos
Janela da alma
Eis o meu trauma:
O romantismo morreu?


O AMOR, NEM SEMPRE NÃO...

O que pensa um coração?
Não se sabe ao certo...
Só sei, porém, que o olhar
Fala mais do que o silêncio
De todas as bocas do mundo...

Um coração precisa
Do diálogo taciturno dos anjos
Assim como,
Um olhar precisa
Do sorriso apaziguador dos ventos...

Há na alma
O segredo irrevelável do amor
E na mente,
O poder iminente desse mesmo amor.

A flor despetála-se
Em seu tempo exato;
O amor, porém, nem sempre não
Permanece enigmático...

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

A POESIA EM PROSA


 DECLARAÇÃO DE AMOR  À POESIA

Prezada Poesia,

Abstrações mil!!!

            Há muito que vivia latente e sempre quis exprimir do meu âmago anímico a essência que se referisse única e exclusivamente à abstração, isto é, pela metáfora ou figuração. Hoje, certeiramente, posso contar com você minha Poesia minha, e dizer, sem constrangimento e sem receio, de que partilha poeticamente do meu existir.
Apego-me à metáfora para nomear redundantemente Poesia em Poesia. Sim, teu nome. O teu nome  é Poesia como sempre foi poesia e que, a partir de agora, passará a ser muito mais... porque a tratarei poeticamente. Assim como Drummond tratava sua poesia de Lyo ou Lio; Umberto Eco a tratou de Rosa, em O Nome Da...; eu, a comparo a Ema Bovary, mas a prefiro Poesia que assim me satisfaz mais dignamente à abstração que sempre ansiei. Outros (poetas, sonhadores) a terão puramente por inspiração; eu, especialmente, a terei – além da inspiração e da transpiração – por abstração, esta que difere respectivamente de Drummond e de João Cabral, porque o teu nome transcende a poesia de todas as Estéticas por ser Poesia em poesia de corrente lirismo – a minha real abstração.
O meu eu em ti (Poesia) como a minha realização pessoal é o meu emimesmamento demasiado com os meus eus de mim, os quais diferem dos heterônimos pessoano, porque são autodenominações, auto-homônimos dos eus exclusivamente sociais que o teatro da vida exige-me que seja representado, isto é, como um mirífico refúgio à sobrevivência. Entre todos os eus, é a vida Emeceana (Poeta-Poesia) a que me faz estar mais e mais prisioneiro de ti minha Poesia minha para que eu me sinta livre de veras.    
O meu eu lírico é shakespeareano, é trágico como o teatro em Sófocles; já os meus eus estão mais para a lenda de Narciso em que Oscar Wilde, sensivelmente, transferiu e atribuiu até para o lago – literalmente lágrimas –  o narcisismo, este que não é menos demasiado do que a minha admiração por mim, pois não choro a morte de Narciso como o lago, mas tenho lamentado o meu próprio fenecer pela degradação do meu teatro. Aqui sim é que é tragédia – não a grega –, mas a tragédia universal, da qual ninguém está isento,  marcada pelo crudelíssimo e inexorável tempo limitado pela vida, porém, eternizado com sabedoria no amor, na Poesia  e na abstração que ora me vejo submerso.
Ser lírico é ser romântico tal qual estética de outrora que sempre esteve presente em mim a me fazer um eterno nefelibata por me abstrair demasiadamente com o teu nome Concreta(mente) na tríade Augusto-Décio-Haroldo e no Realismo machadiano quando te leio os olhos D’alma, tal qual os de Capitu em ressaca,  e vejo fluir ao mesmo tempo a essência de fêmea-menina-mulher a me exprimir – ainda que timidamente – de teu âmago o que é de ti (Poesia em Poesia); o que é de teu ser, de tua alma e, acima de tudo, do teu nome: Poesia. O teu nome, o qual nunca me cansarei de clamar e de cantar... Poesia, POESIA, PO-E-SI-A.

           Do teu sempre Poeta.      

        

A POESIA  PROPORCIONANDO ARTE

                Outrora, a poesia estava comigo e partilhava da minha existência assim como a amada do trovador nas Cantigas de Amor, ou, como para o poeta, a amada no Romantismo. Neste, por um amor idealizado, naquelas, pela  inacessibilidade do seu amor. Todavia, apesar da intencionada abstração que tanto tenho alardeado no mais íntimo do meu afã, sinto a cada instante a Poesia muito mais próxima de mim parecendo querer se materializar, e de repente me vem à consciência o espírito filosófico, e o logos se instaura em Platão ou a razão poética impregnada do Concretismo cabraliano revestido de transpiração, a se manifestar implorando com toda a razão de um coração, dizendo:
           
Não, minha poesia minha, não te materializa não Permanece em teu estado latente Longe dos meus olhos e dentro do meu coração Que só assim eu ficarei contente.
A poesia que antes sempre estive a expressar sobre os seus sentimentos mais íntimos, agora me vem a mim  e expressa por ela mesma, com muita beleza, o que nenhum poeta jamais conseguiu exprimir e, se assim o fez, fingiu descaradamente como nos colocou muitíssimo bem o poeta português, Fernando Pessoa, ao dizer incluindo a si mesmo sem receio:
           
            “O poeta é um fingidor Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que de veras sente.”
Como o poeta pode ousar tanto em querer falar da poesia? Isso é impossível, inexiste e qualquer intenção que se pretenda é vã, inútil. Só a poesia é que pode falar de si mesma. Só ela conhece a si mesma ante mesmo de Sócrates querer filosofar sobre o “conhece-te a ti mesmo” ela já transcendia a qualquer filosofar, posto que já era a própria forma de se filosofar em Parmênides. A Poesia fala com emoção-razão inspirada numa linguagem camaleônica, aí o poeta se confunde, fica indeciso sem saber ao certo o que é real ou irreal. Se verdade ou se verossímil. O poeta é invadido pela dúvida shakespeareana em Hamelet – Oh dúvida cruel, crudelíssima dúvida! É o jogo eterno das (in)certezas entre a dissimulação e a revelação...

E ante esse transcendental jogo dicotômico de coisas vou mergulhando nesse aquário de momentos repletos de águas de idéias literárias e filosóficas que só a Poesia sabe proporcionar com tanta sutileza, e assim, vou também suavemente mergulhando nesse mundo da arte sem receio.

Mas, nesse aquário não se mergulha qualquer peixe Tem que ser o rei-deus dos mares – não Netuno –, mas o tubarão Pois que nesse mar limitado, pode aparecer um tufão E abalar esse pequeno oceano que se chama coração No qual um único peixe é que pode navegar Assim como nas águas de um mar nunca dantes navegável? Sim, porque assim como em “Os Lusíadas”, Camões, Também me faço pioneiro e desbravador Desse momento inusitadamente feliz de amor Porque são de bons momentos em que se vive a vida Como em “Instantes” do argentino Jorge Luiz Borges.  Nesse aquário de prazer Vinícius dá a sua contribuição E diz que o “amor seja eterno enquanto dure” Ainda que seja num ínfimo espaço desse aquário de cristal.

Poeta e Poesia degustaram na arte culinária, Discorreram sobre idéias afins e diversidade íntimas, extra-arte E fizeram do momento belíssimo uma realidade ameaçadora Por causa de um olhar perscrutador próximo-distante Com se a cena quisesse negar o que estar em Madama Bovary Um olhar gritante que poderia ter estilhaçado o aquário de cristal E tudo se acabasse literalmente em água... Mas não, deu-se em ave. A poesia atendeu ao clamor do poeta e se manteve intactamente abstração E assim podemos transpor o ínfimo e sufocante espaço do aquário Para que, nas asas do pégaso fizéssemos a nossa Odisséia.

No primeiro pouso visitamos a arte poética em Pessoa E fomos diretamente à sua “Autopsicografia” de fingidor Onde a Poesia leu-me belamente versos de amor Entre a suave brisa que emanava do Atlântico E o saboreio de sorvete de chocolate crocante – recheio brigadeiro. Era o idílio bucólico na noite cálida de agosto Recitado pela ninfa com uma beleza íntima Que só uma deusa sabe fazer uso, para seduzir o coração do Poeta.

Para imprimir bem esse momento, proporcionado pela Poesia, foi na arte da pintura que a beleza realmente transcendeu mirificamente, e negou com sapiência  a banalidade entediante da qual vivem reles mortais  atordoados pelas convenções.   Na sala de exposição entre tantas belas-artes como “Pescadores” de Di Cavalcanti, “Independência ou Morte” de Carlos Scliar, “Figura” de Milton Dacosta  foi justamente a de Anita Malfatti,  cuja intitulação estava contida na própria obra  “Valência”, que caracterizou  tudo aquilo que a Poesia intencionalmente queria  expressar para o Poeta seu. Foi na obra malfattiana que este Poeta desvendou que “Tudo Vale(ncia) apenas, Quando a alma não é pequena” nesse metamorforsear de belas-artes-poética.

No segundo pouso, Poeta e Poesia estavam na galeria de artes. E em “Valência” tudo valeu, vale e valerá para sempre Como essência genuína segundo a percepção do Poeta. “Valência” é o retrato de tudo que é arte bela, como a música, a escultura... E entre todas as artes está também o que é e o que não é Está o olhar de admiração do leigo visitante Está a apreciação perscrutadora do amante – da arte Está o olhar de soslaio tímido  do leigo ou transeunte. Por fim, “Valência” não é mais “Valência” como prima obra Para tantos que se valeram em admirá-la repetidas vezes E a cada vez se perderam no infindo universo da obra malfattiana. “Valência” agora nós é um ícone que irá marcar o belo  momento vivido O qual nos insere na obra como parte essencial da emoção sentida. “Valência” é como uma imensurável janela que nos faz continuar a nossa Odisséia Agora, via janela de “Valência”, para o infindo azul celeste do nosso afã. “Valência” vale para si mesma como obra-prima “Valência” vale para tudo e para todos os seus amantes Assim como, Mário de Andrade, poeta modernista  Que nunca se cansou em admirá-la por muitas e muitas vezes E como também o fez Francisco Ivan, Dr. em literatura - como me assegurou enfaticamente a Poesia. E por fim, fizemos nós – Poeta e Poesia – o mesmo por três vezes apenas, Mas que não nos isenta de estarmos naquele livro fechado Na fusão entre artesão e artesanato ou poeta e poesia A dançarmos da partitura a canção, a admirarmos no jarro o artesão, O músico no violão como se no todo ou na parte  Houvesse sempre e sempre algo de (todos) nós. 
   

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

ANIVERSÁRIO DO 1º ANO DO PONTO DE LEITURA - BCOG

BIBLIOTECA CULTURAL OTÁVIO GARCIA E O PONTO DE LEITURA REALIZAM, EM 23/10/2010, PROJETO CHÁ COM POESOFIA, TEMA LIVRE COM O SOCIÓLOGO JAIR POPPER, ÀS 14:00 H (SÁBADO)






COMO CHEGAR À BIBLIOTECA

sábado, 2 de outubro de 2010

DO LIVRO: BISACO DE PENSADOR MAIS UMA RUMA DE IDEIA





BISACO DE PENSADOR
(Autor: M. C. Garcia)

Carrego idéias no meu
Bisaco de Pensador:
São poetas e filósofos
Justos no bem, no amor.
Sou arauto da palavra,
Da poesia, Lavrador.

No meu humilde Bisaco

Tem poeta nordestino;
Do Romance ao Cordel
Da moira ao desatino,
Reflete todos mortais:
Que terão mesmo destino.

E vem de remotos tempos,

Epopéia Universal:
Ilíada e Odisséia
Antiga poesia oral,
Desse poeta Homero,
Trovador descomunal.

E o fundamento oral

Leva nome poesia.
E por sua vez, Parmênides
Fez sua Filosofia
Poema Da Natureza:
Base da Ecologia.

No meu Bisaco têm Sócrates,

Aristóteles, Platão.
A Filosofia grega
Trazida por geração;
Pré-socráticos, também:
Heráclito e Zenão.

São Filósofos, Poetas

Que buscam elevar o Ser
Em nome da Metafísica,
Que só enaltece o ter
Essência de fazer Bem,
Desprendimento viver.

E dos Cristãos Pensadores

Eis, São Tomás de Aquino,
E, também Santo Agostinho,
Uma dupla do destino
Do nosso mundo cristão,
Pelo Deus nosso Divino.

Filósofo do Sertão,

Violeiro cantador;
E quem romanceia terra
É chamado escritor;
Os que falam com encanto:
Cordelista, glosador.

Eis Luiz Gonzaga, Rei,

Que criou, cantou Baião;
Também, José de Alencar:
Iracema, a Criação.
Do Assaré, Patativa
Fez poesia do Sertão.

Pois carrego menestréis,

Bem como os cordelistas:
Zé Limeira; Zé Praxedes
E também os repentistas:
Negra Chica, Zé da Luz,
Poetas popularistas.

Eu tenho no meu Bisaco,

O Pavão Misterioso;
João Grilo, Amarelinho;
Cancão de Fogo, tinhoso.
São Clássicos do Cordel
Desse clã maravilhoso.

Vamos pra Literatura

Do meu Barroco Brasil.
O Gregório Matos Guerra,
Boca de Inferno mil
Da crítica, da política,
Da igreja ao Pastoril.

Tem agora o Arcadismo

No bucolismo a plaga
Em Marília de Dirceu,
Obra que não se apaga.
Glauceste, amigo de
Tomás Antônio Gonzaga.

Eis, então, o Romantismo.

Nessa poesia a Corrente
Dividida em três fases
Porque surgiu muita gente,
A retratar o Nordeste,
Pobre terra indigente.

E vejamos Castro Alves,

Um condoreiro, à vista;
Eis também Gonçalves Dias,
O Poeta indianista;
E o Graciliano Ramos,
Do Romance sertanista.

Machado de Assis foi

Realista, o precursor.
Academia de Letras
Fez, e poetou o amor
No seu livro: Dom Casmurro,
Capitu - mulher vigor.

Das estéticas, três linhas:

Vem logo Naturalismo,
Sendo a contemporânea
Desse mesmo Simbolismo;
Antecessor do Moderno,
Eis o Parnasianismo.

Aluísio de Azevedo,

Poeta Naturalista;
Alphonsus de Guimaraens,
Verdadeiro Simbolista;
Poeta Olavo Bilac,
Príncipe Parnasianista.

Os Pré-modernistas, veja

Onde Os Sertões e tudo
Fala o Euclides da Cunha
Do Conselheiro Barbudo.
E vem Augusto dos Anjos,
Grande poeta raçudo.

E entremos no Moderno,

Eis a Semana de Arte,
Teatro Municipal.
E é São Paulo quem parte
No ano de vinte e dois
Pra terra de Malazarte.

A Obra Macunaíma

Deste Mário de Andrade,
E Juntamente Oswaldo,
Bandeira quebra a “grade”,
Com o seu poema Os Sapos,
E assim, faz-se confrade.

Eis Corrente genuína

Às terras do meu Brasil,
Porque descobre Cascudo
E outras culturas mil;
E a Antropofagia
É comer estranja vil.

Chegamos ao Concretismo,

Tríade dessa Estética:
Décio, Augusto e Haroldo
Quebram o verso com ética.
Ferreira Gullar, o crítico
Das plásticas, da poética.

Mas, há na Literatura:

A Visual e Processo,
A Marginal e Hai Kai
São Poesias em progresso:
Tem a Experimental...
Todas livres - um sucesso?!

Então, o contemporâneo

Deixou tudo bem legal.
Cresceu a Literatura
E se fez universal.
As correntes se findaram.
Tudo real-virtual.

E há instituições

Que elevam o artista,
Poeta, versejador,
Pensador, socialista
Filósofo, cantador
Bem como, capitalista.

Há poetas nas Favelas

A mostrar realidade,
No som: Rap, Hip Hop,
Transformando a Cidade.
São marginais, não bandidos !
Sabedores da Verdade.

Porém, há alguns parnasos

Que não vivem na real,
Estão inventando moda,
Falando de bem e mal
Poeta e cordelista
Mas, para mim, é normal.

Pensadores e poetas,

Pra mim são todos iguais,
Ante bandeira que levam;
São normais e anormais.
São da Razão-Coração,
Sendo todos Universais.

Sou poeta pensador,

De nome Eme Cê Garcia;
Vou lidando com Palavras,
E escrevo Poesia;
Mas, quando a meditar,
Vivo a Filosofia.

Meu Bisaco, minha Mente.

Por isso, sou Pensador;
Bisaco à tira-colo
Não passa de portador;
São coisas materiais.
Porto, deveras, AMOR.

Esse vai aqui guardado

No CORAÇÃO, na Cabeça,
Eu vou por esse Rincão,
Talvez, você desconheça.
E, lê este meu Cordel,
É PRECISO, NÃO ESQUEÇA !


A CANTILENA DA PAZ*M. C. Garcia
Clamo às musas da paz
Que me oriente agora
Neste meu canto pacífico
Diferente de outrora
Sou menestrel mensageiro
Que aqui a paz implora.

Eis uma nova atitude
De a paz se conquistar
Sócrates, Gandhi e Cristo
É tríade exemplar
Mas hoje, muito mudou
Então, a paz é cantar.

Cante pra corrupção
Aos que promovem a guerra
Cante para todo o mundo
Que vive sobre a terra
Cante sempre com amor
Que todo esse mal se encerra.

Cante para injustiça
Da fome do seu irmão
Cante para a vigarice
Da qual usa o patrão
Pois cante, porque o canto
Transcende em oração.

Meu poema canta a vida
Dos que são discriminados
Dos meninos inocentes
Que vivem abandonados
Sem escola, sem carinho
Sem punição dos culpados.

Cantemos pra que não surja
Entre nós o inimigo
Que possa vir disfarçado
Dizendo-se ser amigo
Meçamos seu coração
Se há ódio – há perigo!

Não darei grito de guerra
Porque eu não sou guerreiro
Faço meu canto de paz
Pois sou poeta altaneiro
Canto mais amor à vida
Como novo justiceiro.

Pois não se deve gritar
Grito é puro horror
Que se cante com beleza
Porque reflete o amor
Para que a humanidade
Supera a sua dor...

Poeta não usa arma
O poeta tem caneta
Escreve com o coração
Com a força de um cometa
Na escrita tem poder
Para salvar o planeta.

Caneta é para a vida
Arma é destruição
Escrevo está metáfora
Em nome da construção
Do bem, de toda justiça
Em forma duma canção.

Todo cuidado é pouco
Dobremos nossa atenção
Do que estamos fazendo
Em nome desta nação
Cantando ou trabalhando
Pela paz e união.

Façamos o nosso hino
Esta bela cantilena
Seja ela a bandeira
E também nosso dilema
Uma forma de oração
No cantar deste poema.

Escrevo como filósofo
Mas, coração de profeta
Quero que este meu canto
Dê à luz a qualquer meta
Voltada em nome da paz
Que traz o homem-poeta.

Pois sou M. C. Garcia
Gente igualmente a vocês
Porém, vivo a refletir
De quando será a vez
De o homem ser ele mesmo
Fugir do seu grande esmo
E deixar desse talvez...

* Poeta e Filósofo

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

POEMAS PUBLICADOS NA ANTOLOGIA DELICATTA V




M. C. Garcia (Natal – RN)

Um hai kai

Eu não sou profeta
Um Hai Kai em meu juízo
Por isso eu preciso ser poeta!

Ascensão e queda do amor

Amor te amo
Amor te quero
Amor te clamo
Amor te venero;
A morte amo
A morte quero
A morte clamo
A morte venero.

Artes cínicas

Ator... tura
Atriz... teza

Canto e dor

Quando canto, digo EU
Expressando-me em português;
Quando falo, sofro “AI”
Expressando-me em inglês.

O bom da vida

O bom da vida é namorar sempre...
Não morando!

O poeta

Do pó vieste, ao pó retornarás;
Por isso, ser pó é tá sempre...
Poetando!

A mente mente

Nem tudo que você sente
É verdadeiro ou real;
Sabe-se que a mente mente
E lhe causa um grande mal.

Mata e morro

Aquilo que se diz mata
É verde de esperança;
Também quando se diz morro
São dunas por semelhança.


O bom português

Stress é para inglês
Temos que ter aperreio
No nosso bom português
A cura vem sem receio.

Doenças imaginárias

Doenças imaginárias
Tem matado muita gente;
São coisas desnecessárias
Criada da própria mente.

Contato:garciamc2001@hotmail.com

ENTRE-VISTAS-DE-SI-MESMO

Entre-vistas-de-si-mesmo


Aos 40 anos, o alternativo Maurício Cardoso Garcia é o mais desconhecido poeta da história da Literatura Brasileira. Para o universo literário já escreveu dois livros de poesias, Dendroclasta, São Paulo, SP, 1988; e Paradoxo EUniversal, Natal, RN, 1997. Existem, apenas, alguns gatos pingados desses dois livros, quase esgotados, pela tiragem mínima de 500 exemplares. Tem alguns trabalhos, escritos em prosa, para serem publicados posteriormente, tais como, contos, crônicas, ensaios, reflexões e romances. Todos esses estão aguardando apenas o tempo, para dar ar de suas graças, não mais que seis anos, no máximo. Maurício C. Garcia conta nessa "entre-vistas-de-si-mesmo", ou, como queira, uma auto-entrevista, de como se fez poeta sem ter referência nenhuma na família, como se dá o processo da sua criação e explica o sentido que leva o título de seu último livro, Paradoxo Euniversal.

M. C. Garcia


MC: O que te levou a escrever poesia, já que inexiste na sua família, qualquer referência para tal fim?


GARCIA:
Bom, a priori, eu nunca considerei poesia o que escrevo. Chamo de Minhas Idéias Minha - MIM. É assim, que as denomino, porque tudo que eu quero, penso, sinto, - ou, nenhuma dessas coisas -, escrevo. Talvez, o que tenha me levado a escrever mesmo, fora a falta ou o referencial de tudo aquilo que sempre se diz quando se está a entrevistar um artista: "o meu pai sempre escreveu e eu aprendi com ele"; "eu gostava de ler muito, eu lia tudo que via pela frente", ou, "eu lia Cordel para as pessoas que não sabiam ler"; "eu comecei a escrever aos 10 anos", ou, como já prevendo os futuros gênios da literatura universal, daqui a alguns anos, "eu comecei a ler aos oito anos, li a coleção inteira de Harry Potter; e muitas coisas mais de que você sabe muito mais do que eu. Eu nunca pude nem tive tempo de me interessar por essas coisas, quando do zero aos dezoito anos, a leitura de livros, para mim, era o que menos me interessava, estudava por estudar simplesmente; as escolas não estavam nem estão preocupadas a incentivar ninguém para ler; talvez, acreditasse em transformar-me num autodidata como o meu pai foi e Machado de Assis, também. O meu pai, não precisou de escola para ler e escrever e para se tornar chefe de Estação Ferroviária. Eu morava num sítio, tomava banho de maré, via mulher nua tomando banho no rio de meu avô, subia em azeitoneira, mangueira, cajueiro, jogava bola, pegava goiamum. Esta era a minha poesia ao vivo e a cores; como que eu poderia escrever algo que já fazia parte de mim, ou seja, se eu era a própria poesia em pessoa. Não aquele (dos heterônimos), mas eu mesmo. (risos). Mas, o desejo pela sobrevivência me arrancou dessa Poesia Real e me mandei embora para São Paulo. E, foi daí, que comecei a buscar refúgio na escrita, mesmo sabendo que era péssimo ou sou(?) em Português; e, então, para preencher o meu vazio, passei a escrever, mesmo sabendo que a tirana Gramática iria me inibir e me limitar a muitas coisas, como tem limitado a tanta gente, por aí; agora, já não tenho mais medo, perdi a vergonha para me curar do meu vazio e mandar a Gramática, gramáticos, críticos e tudo mais para o espaço, para preencher assim, o meu vazio. Mas a poesia maior que havia deixado em minha terra natal, Natal, foi a minha família, composta de nove irmãos, que na ocasião, eram oito em casa, fora eu; ou seja, nove fora um. A matemática justificava a minha moira. Mas, para ser mais preciso, no que estou falando, escute essa minha idéia, a qual, redigi quando ainda morava num quarto de pensão, em Sampa:

Meu mar meu mundo macrocosmo
Minha menina mulher maravilha
Marca motiva mente
Movimenta mensagem medíocre
Meu medo meu mal melancolia
Mede meu mundo
Minha messe mulher missionária mãe
Manda milhares miríficas
Mundo mudo
Malandro maltratado maltrapilho
Mundo mendaz
Massacre mostra miragem
Mãos mutiladas matam
Mentira mente modifica meta
Mundo máximo
Mestra miss Mulher
Muda mundo mudo mendaz
Meninos marotos milhões
Maurício Maurílio Marcílio
Máximas meninas marcantes
Marina Marlene Marli
Maílde Marizélia Matilde
Microcosmo mundo maternal
Mulheres mães mártires
Marcando meu Mundo “M”.

M. C.: Como se dá o seu processo de criação?

GARCIA: Escrever para mim é completude, ou seja, o preenchimento daquela lacuna que está a me incomodar de forma inesperada; não consigo criar espaço nem situação para redigir, é tanto que, quando alguém me pede para que lhe escreva um poema eu digo que não consigo. Não sei fazer poesia - entenda-se como idéia -, engajada, que não seja aquele engajamento que surge na hora em que não quero e quando, às vezes quero, sempre sai outra coisa, de que termino gostando ou não, mas deixo do jeito que está e guardo. Acredito que essa idéia também tem a ver comigo. Já escrevi dentro de metrô, numa oficina metalúrgica - imagine você, o barulho que faz, desculpe, não cabe para você, mas para quem estiver a ler esta - já escrevi, sozinho, em meu apartamento, quando solteiro, já escrevi em meio a multidão. Não acredito nessa coisa de se estar num lugar calmo, tranqüilo para que venha a inspiração, esta aparece em qualquer lugar, a qualquer hora, de qualquer forma, até mesmo dentro da própria transpiração poética, ela aparece. Isto é, pelo menos, para mim. Antes pensava que o que me fazia escrever era estar, morar e viver em São Paulo, sozinho, longe dos meus familiares; uma vez retornando, definidamente para o aconchego familiar, tudo continuou como "dantes no quartel de Abrantes". Antes, eu vivia num processo para a completude de mim mesmo, hoje, já não mais sinto o mesmo vazio, acredito que as minhas idéias, possam um dia ser criação realmente, porque o que tenho feito, é ousar, já que não vivo das minhas idéias, mas sim, tenho vivido muito mais para elas.

M. C.: Conte-me como surgiu a idéia de lançar um livro?

GARCIA: Nunca me passou pela minha cabeça o interesse de publicar livro algum, mesmo sabendo que, quem escreve quer ser lido ou visto um dia, a não ser, que este se torne auto-inquisidor e incinere tudo que escreveu um dia. E, isto não é muito raro acontecer. Eu costumo dizer, que escrever é retratar a alma alegre ou sofrida, ou seja, escrever é o retrato fiel de si mesmo, que ninguém mais que nós mesmos, é capaz de perpetuar o metafísico em concretude metafórica, graças ao poder da linguagem escrita, falada, etc. Tudo surgiu, quando um colega de trabalho - metalúrgico como eu - me entregou um recorte de jornal, no qual, continha informação a respeito de um concurso de poesias, que por muito insistir, terminei enviando uma idéia que refletia sobre os maus tratos dos animais, intitulada Liberdade. Para a minha surpresa, dois meses depois, recebi uma carta dizendo-me, que havia ganhado o terceiro lugar e, para a surpresa maior, dias após, o mesmo órgão me informava que havia falido. Não sei afinal, se realmente aquela colocação fora real, é tanto, que não me entusiasmei; outrossim, passei a participar mais de concursos e de eventos, em que a poesia era a personagem da vez. Adquiri certificados de honra ao mérito, elogios e mais elogios, notas excelentes, mas nada disso mudava a minha forma de ser ou pensar a respeito das minhas idéias. Contudo, fui vendo que elas eram classificadas como poesias. E para confirmação maior, de todo esse contexto, em meados da década de oitenta, assisti a uma entrevista do, então poeta, Carlos Drummond de Andrade, quando deu-me o conceito de poesia numa simplicidade que era tão dele e, leu um poema, que se assemelhava com algo que já havia escrito e que estava lá nos meus alfarrábios. Daí, foi quando preparei um protótipo de livro: O Recado, em 1987. Nesse ínterim, vim à Natal, passar as férias de dezembro, de 1988; e, quando voltei, O Recado, se transformou em Dendroclasta, o nome do meu primeiro livro.

M. C.: E quanto, ao Paradoxo Euniversal, que parece soar algo como entidade religiosa, como surgiu esse nome?

GARCIA: Eu, geralmente, procuro induzir as pessoas - desatentas - ao erro, quando estão a ler certa palavra que crio. Poucas pessoas conseguem pronunciar a palavra "dendroclasta", e muitas até, a desconhecem, pensando que se trate de um neologismo, que por sinal, gosto muito de inventar novas palavras. Mas, dendroclasta, não vem ao caso; é um vocábulo encontrado em qualquer "pai dos burros". Quando o intitulei de Dendroclasta, quis induzir as pessoas a imaginar a palavra democrata; e, ao mesmo tempo, na época, em 1988, já se cogitava um encontro mundial, no Rio de Janeiro, sobre a ecologia. Por isso, dendro é árvore; oclasta , destruidor. Quanto ao Paradoxo Euniversal, vesti-me da mesma intenção, ou seja, de posse da palavra, que é dada, que esta aí, para todo mundo, simples, comum, trivializada pelo uso do senso comum que chega, às vezes, a ser despercebida. Digo, quão despercebida, que numa sutil mudança que se dê ou se faça, as pessoas continuam vendo a mesma trivialidade, por se trivializarem, igualmente, àquilo ou naquilo que trivializaram-no. Isto é o que chamo de mudança do geral desgastado, para o particular criativo. Ou seja, de "Universal" para "Euniversal", uma sutil mudança de poder transformador. Vale apenas salientar, que Euniversal, a palavra, só surgiu após quase tudo pronto, mormente, no acabamento final da capa. Assim como o primeiro foi mudado, este também foi mudando, em cima da hora. O nome do livro iria ser, simplesmente, Paradoxo. Nos últimos momentos foi que surgiu o Euniversal. Esta é a vantagem, para quem consegue escrever e editar o seu próprio livro. Costumo dizer, que o que faço, se assemelha ao artista plástico que constrói a sua própria tela, em seu ateliê, e depois, cria a sua arte, pintando. Quanta à semelhança, com entidade religiosa, é apenas uma chamada de atenção, com relação à alienação, para àqueles que confundem o próprio nome do livro.

M.C.: Há mais de cinco anos que foi lançado o Paradoxo Euniversal; distou-se em torno de quase dez a publicação deste para o Dendroclasta. Por que tanto tempo, para se escrever um livro? Ou já existe algum, no prelo?

GARCIA: Como já falei antes, eu não vivo do que escrevo, escrevo por que vivo. Não dependo das minhas idéias para sobreviver, sinto que iria morrer de fome se dependesse, para me sustentar delas. Não me considero nenhum escritor, que seja capaz de vender livros, como um Paulo Coelho ou uma J. K. Rowling, que são recordes de venda, no mundo inteiro. Me contentaria em vender, apenas, os livros que fossem capazes de cobrir a despesa que tenho, quando os publico autonomamente; apenas isso, já me serviria de grande incentivo e valia, mas, que nem sempre acontece. E, nem por isso, parei de escrever. Continuo a escrever a todo entusiasmo. Tenho projetos, muitas idéias para a posteridade, que me parece, que este vindouro, não me está tão longe assim; apenas, talvez, alguns anos mínimos, em torno de 6 anos no máximo. Mas, acredito, que antes de dez anos, do último que lancei, possa sair algum outro, por aí. Não sou de fazer planos, mormente para isso. Gosto de oportunidades, e sei que sempre surgem, acredito demasiadamente nelas. A minha maior ousadia é lançar um livro em prosa, ou seja, um livro de contos, crônicas, ou, um romance. Este, por exemplo, gostaria de publicá-lo, em torno dos meus sessenta anos, ou quem sabe, em breve. Tudo isso, porque a maioria dessas idéias já está concluída em disquetes e CD ou, em pré-livros, como assim posso chamá-los. Só para adiantar, eis alguns nomes, de alguns deles, que já dão sinal de vida e que já estão a caminho do "prelo": Povarejo (contos e lendas); Cincos Contos Reais (crônica); O Sítio Santa Maravilha (conto); As Reflexões de Ossiab - O Menino de Maré (micro-romance); Amaramor (poesia); Poesia Flertante (poesia); Livro Livre Dy Versos (poesia visual); e, a minha maior ousadia, como disse, o romance autobiográfico, As Reminiscências Oníricas de Ozodirak Narum - O Especialíssimo. Não estou preocupado com o tempo, acho que irei viver muito tempo, talvez, o suficiente de poder ver todos esses trabalhos publicados, independentemente de querer entrar no livro dos recordes. Acredito, que tenho batido os meus próprios recordes ao me surpreender comigo mesmo, com as "minhas idéias minha" acanhadas mas, possivelmente, repletas de ousadias.

M. C.: Voltando um pouco atrás, o que diz, na sua essência, a intitulação Paradoxo Euniversal, por que este nome?

GARCIA: Eu já esperava por essa sua indagação. Todavia, ninguém melhor do que você, para me conhecer mais que, da minha mão, a palma; conheces mais ainda, a fundo, a minha alma. Por isso, tentarei responder, como se estivesse a me olhar ao espelho, cercado por olheiros, mas ciente de que as paredes, além de ouvido, têm muito mais consciência. Este livro, talvez, seja o único e o último que escrevi, em que busca retratar aquilo que existe de mais íntimo nas minhas idéias. Seria a coisa do ser homem com todos os seus defeitos e virtudes; seus amores e ódios; seu egoísmo e altruísmo; o homem dicotômico e - na sua expressão mais barroca e mais antitética -, o homem que pode se manifestar ou se apresentar, sem se revelar abruptamente, ante à sociedade. Mas que, sutilmente, pode adentrar, em qualquer espaço ou lugar, sem alterar a sua essência do Eu Universal; este "EU" que é intrínseco e que é inerente, a todo ente em extremo paradoxo de si mesmo. Quando falo dos Eus Sociais, com os quais, nós precisamos nos identificar e nos revestir sempre de uma personagem, para representar o momento; digo, todos os momentos, em que somos obrigados pela sociedade, a partilhar de situações adversas; assim como, no trabalho, em casa, na igreja, na escola, no bairro, no clube, no supermercado, na praia; lugares estes, onde jamais, podemos confundir o simples ato de ir à praia de paletó e gravata com o de, de repente, ir à igreja de biquíni; ou, senão, trazer uma pilha de problemas do trabalho e descarregar sobre os filhos ou esposa, ou, levar os problemas de casa, para o trabalho. Todos esses comportamentos exigem uma atitude inteligente, em que se saiba administrar os paradoxos, acima de tudo, Euniversais, que são a inveja, o ódio, a ganância, a falsidade, isto é, dentro da linha de nocividade; e, em paralelo, numa linha salutar, o desapego, o amor, a verdade. Não parece muito fácil conseguir não confundir os papéis sociais quando, em verdade, poucas pessoas conseguem essa façanha. Agora, uma vez conquistado esse espaço, está-se livre do estresse, dos aperreios, das insatisfações do dia-a-dia e, acima de tudo, das confusões constantes, de que se faz, por se confundir um determinado espaço com outro, que não tem muita coisa a ver. Por exemplo, um protestante radical querer discutir, em sala de aula, de que Nietszche está errado, quando diz que "Deus está morto". Eis que estamos diante, duma situação totalmente esdrúxula, mas autêntica, para aquele que não sabe o poder de discernir os seus papéis sociais. O Paradoxo Euniversal, em síntese, procura refletir essa realidade, quão complexa, mas inteligente para se viver e se colocá-la em prática, todos os dias da vida e por toda a vida existente. O único problema desse livro é que, ele foi escrito em versos, e não em prosa, ou seja, não tem as receitas dadas e acabadas, como estão nos, bem-sucedidos, livros de auto-ajuda.

M.C.: Para fechar a "nossa-minha-e-tua entre-vistas-de-si-mesmo", diz-me o que é ser artista de si mesmo?
GARCIA: Acho isso, um negócio muito arriscado e perigoso; pois, que pode até gerar conseqüências graves, tais como - na atual circunstância - ter que refazer o trabalho, não adquirir a nota suficiente ou, senão ser aceito por pena de não passar ou passar por bobo, louco ou idiota. Contudo, como artista de mim mesmo, assumo o risco desta minha atitude de fazer, do trabalho solicitado em sala, a "minha-tua-e-nossa" entre-vistas-de-si-mesmo, como trabalho final do Professor José Ramos Coelho, Esteta Existencial, cuja disciplina, que ele leciona, é Estética Filosófica. Não sei com que olhos, coração, mente ele verá, sentirá, entenderá essa minha-tua-e-nossa atitude, até certo ponto ousada, em criar uma auto-entrevista. Bom, sinceramente, eu desconheço pelo menos, ao nível de academia, algum docente que tenha acatado tal desatino, de pobre e miserável discente. Certa vez, disse, que ousar é criar e criar é transcender os paradigmas dos convencionais ultrapassados. Para mim, ser artista de si mesmo, não é ficar a se olhar ao espelho, é transpor esse espelho, para ver o que existe no outro lado de si mesmo; estou em busca de me conhecer e não me farei como o fez Narciso. Oxalá, que o aforismo socrático venha a mim fazer conhecer-me a mim, como artista de mim mesmo. O enigma foi lançado, e como Édipo, que teve seu castigo merecido, predestinado em sua moira; o meu, jovem MC, faz-se em enigma ainda a ser decifrado. Oxalá, o mestre o decifre!

Natal, 14 de Março de 2002, dia nacional da Poesia.


M. C. GARCIA

EMECÊ GARCIA ENTREVISTADO POR ROSANA

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

EMECÊ GARCIA ENTREVISTADO POR ROSANA SOUZA NA BIENAL INTERNACIONAL DO LIVRO EM SÃO PAULO

AMIGOS SÃO ESTRELAS...







Uma das melhores coisas que a Bienal nos viabiliza são as oportunidades de conhecermos pessoas especiais que passam a fazer parte do nosso mundo, o mundo da poesia...
Amigos queridos que até então conhecíamos apenas através do mundo virtual e que
através do passaporte da poesia entram para o mundo real!
Conheci muitas pessoas especiais, na verdade, todos são especiais, pois todos somos
seres únicos e perfeitos diante do criador, porém são os momentos vividos que aproximam as pessoas e a mágica da amizade acontece!
A Má, é uma dessas pessoas, que mesmo à distância mantemos uma amizade próxima; assim como outros que já passaram por esta sala de chá e poesia!
Aos poucos venho trazendo neste espeço pessoas que conheci neste mundo virtual,
mas que são reais em nossas vidas...
Hoje apresento aos amigos da Blogosfera Mauricio Cardoso Garcia, ou Emecê Garcia como gosta de ser chamado e é conhecido. Tivemos a oportunidade de nos conhecermos ao vivo e em cores na XXI Bienal Internacional do Livro.

Emecê Garcia nasceu em natal, Rio Grande do Norte, em 19 de junho de 1961. Professor, Poeta, Filósofo, Contista, Militar e Nicles; tem seis livros publicados (Dendroclasta, Paradoxo Euniversal, Povarejo, Bisaco de Pensador Mais Uma Ruma de Ideia e Povarejo em Dobro e Crônicas de Uma Crônica Vida).

Perguntei a Maurício o que representou para ele ter participado da XXI Bienal do Livro, abaixo o depoimento dele:

Foi para mim muito importante, visto que me era um sonho que vinha alimentando há algum tempo; já havia estado em outrora apenas como visitante, na década de oitenta quando morei em Sampa. 
Representou para mim um momento inusitado e ímpar na minha vida e na vida daqueles que realmente gostam da literatura e acima de tudo do prazer de ler, e e isto nos é de suma importância
para ampliar os nossos conhecimentos, como também, uma oportunidade de nos expor através das nossas obras para que outros possam ver a avaliar. É isso, que acredito.

Maurício, o que é ser poeta pra ti?

Ser poeta é ser distinto, às vezes ignorado, não compreedido, louco, egocêntrico, mas acima de tudo é ser livre e ousado para sonhar e dizer tudo que sente e que as vezes também não sente, mas que pensa de forma quão racional que chega a ser mal interpretado diante de alguns sistemas (ou cabeças) fechados (as)

Na tua visão, como é ser poeta neste mundo onde a poesia está perdida e esquecida nas prateleiras?

Ser poeta só é bom para quem é verdadeiramente poeta não levando em conta esta realidade do sucesso ou insucesso, acredito que para o poeta o ato de escrever já lhe é uma grande satisfação e realização. Certamente, não é de hoje que a poesia, acima de tudo no Brasil, tem sofrido esse descaso cruel. Os "grandes poetas" brasileiros não viviam propriamente da arte poética, mas de um outro ofício distinto, geralmente funcionários públicos. Para mim a poesia surge antes de tudo isso e o sucesso é apenas uma consequência.

Tens algum livro no forno?

Sim, tenho vários livros. Estou trabalhando um romance autobiográfico, para lançar em 2012, se Deus quiser. Tenho uns três livros de crônicas e contos já prontos a qualquer momento podem sair do prelo, intitulados (VEVE e LUCINA / CINCO CONTOS REAIS / SÍTIO SANTA MARAVILHA) e muitos outros.

Qual o supra sumo dos teus livros?

Trato em meus livros das coisas do mundo (social, político, amoroso, racional) acredito que seja isso.

Palavras de Emecê Garcia:

Verdade, justiça e amor, muito amor no coração da humanidade e acima de tudo no meu.

Hora de tomar chá e saborear os poemas do nosso amigo poeta Emecê Garcia!





Poemas de Emecê Garcia
Do Livro Paradoxo Euniversal.









CONFESSO QUE SOU SONHO

Senti todos os meus sonhos
Possíveis e impossíveis
Possíveis Pelo que sou e sinto...
Impossíveis Pelo que escrevo e penso...

Confesso que não vivo. SOnho...

Sonhei todas as vidas para me tornar sonho
Desta realidade puramente utópica...

Confesso que sou sonho
Porque sinto.

Recados para Orkut




O SENTIR

Quando te vi
Em algum lugar do vindouro
A minha utopia me dizia
Em meu devaneio
Que eras real
E o meu afã
Tão logo se concretizou
Te encontrei
Quando não te procurava.
Mas o meu sentir
Em algum lugar do pretérito
Já havia edificado o teu ser.

Antes do antes
O existir.
Depois do depois
O sentir...
Após a eternidade
Seremos infindos
No sentir do Nosso SENTIR.






Contatos do autor:
e-mail: garciamc2001@hotmail.com

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

TEORIA LITERÁRIA

 

LITERATURA E MODERNIDADE

BREVÍSSIMO COMENTÁRIO

Inicio esse estudo utilizando-me do que disse Mário de Andrade  no texto: O Movimento Modernista: “Ficar no aprendido não é ser natural: é ser acadêmico; não é despreocupação: é passadismo.” Eis a lição que talvez tenha servido a Márcio Souza para criar a sua obra não ficando apenas no aprendido, envolvendo-se à necessidade espiritual no uso do direito antiacadêmico, descamuflando-se das técnicas da vida, como aclamara Mário, e se fez pícaro marchando com as multidões de além-moderno do neopicaresco?
Se ser moderno é viver uma vida de contradição como disse Marshall Berman, Márcio Souza com seu   “desejo de mudança” conseguiu transpor da vida à obra literária tal contradição. No romance Galvez: Imperador do Acre, Márcio, cria várias possibilidades de se fazer uma leitura ao inserir um estilo literário que faz lembrar Brás Cubas de Machado de Assis, mas com um sabor de além Realismo. Sua obra moderna se insere na modalidade neopicaresca onde se tem como ponto alto a figura do anti-herói, do bobo, do bufão. Uma personagem que toma vida no modernismo pelas mãos de Mário de Andrade em Macunaíma e que Márcio se utiliza  muito bem em sua obra.
Encontramos em sua obra  de ficção figuras da história da borracha, o Látex, do norte do país, que se misturam com nativos, mitos, lendas, alienígenas e extraterrenos sem tirar a seriedade nem o deleite do “viver literário”.  Encontramos também, na sua forma mais explícita que a técnica exige, exemplos de Ata, Conferência, Agenda, Ordem de Serviço, Decreto, Bilhete, Receita de remédio, Diálogos  (Diálogos do 3º Mundo II) como são literalmente reproduzidos em peça de teatro ora numa linguagem culta ora coloquial,  extinguindo assim, o receio de se iniciar uma frase com pronome oblíquo (Me ofereci para...), graças ao recurso da poesia e como fez Mário e disse em seu texto citado inicialmente.
Há algo do que sugeriu Oswald de Andrade em seu Manifesto Antropofágico de 1928, em Galvez, bem como também de Mário em Macunaíma, isto  graças ao recurso da paródia  e da transcendência (moderna?) literária na modalidade neopicaresca. Em Galvez,  o “Tupy or not Tupy is the question” de Oswald, está presente nos capítulos fragmentados da sua obra assim como Love and Revolution, Gand Finale ou Petit Apothéose, Calderón de la Barca, Vade-Mécum do Comportamento e em muitos outros, como veremos mais adiante (em, Alguns Capítulos: Galvez, p.7) Márcio constantemente alimenta-se antropofagicamente em criar neologismos  (Floresta Latifoliada), misturar textos, frases, epígrafes em francês, inglês, espanhol, latim em sua obra exatamente como um pícaro esfomeado por comida, poder, dinheiro e mulher. Márcio, por sua vez, por conhecimento e cultura, e porque não dizer também, nós esfomeado pela pesquisa.

MC Garcia



EXÓRDIO

Eis um estudo de análise-proposta do romance picaresco Galvez:  Imperador do Acre,  que através do recurso da paródia procuro fazer uma análise-pícara? Talvez, isto graças à idéia que tive  na escolha do tema Anatomia textual, por ser um assunto pertinente e, acredito, bem sugestivo para o que me proponho a fazer, que é explorar a riqueza do erotismo que existe na obra.
Nesta análise, vale ressaltar que quando estiver falando do romance Galvez Imperador do Acre, o denominarei de obra, a qual nos dá uma noção precisa daquilo que intenciono nessa proposta, por tratar de um vocábulo do gênero feminino; o mesmo servirá  à palavra estrutura que será denominada de  Anatomia Textual. Não posso deixar de dizer, que a análise anatomia textual,  seguindo e honrando as linhas de um GALVEZ ou de um BUSCÃO  faz também as suas digressões que  irão tratar especificamente da fábula, da narrativa dentro da narrativa, de alguns capítulos da própria obra e do romance neopicaresco. Mas, se por acaso, o leitor  deparar com algo sobre o narrador, o anti-herói ou outros assuntos inerentes a este universo; podem ficar tranqüilos que não se trata de nenhum coincidência não. “Qualquer semelhança é mero Paradoxo” com o que já foi visto ou lido em se tratando de uma manografia.


OBRA EXPLORADA: GALVEZ  IMPERADOR DO ACRE

“É incrível como o povo brasileiro possui uma linguagem de vanguarda”.

Luiz Galvez (pág. 181)


SINAL VERDE

Como todo princípio nunca reservou nada de fácil para ninguém, eu, no papel de alguém, também hesitei como um galucho ante o seu capitão para dar início, ou melhor dizendo, para  apresentar esta proposta de trabalho ao  professor, o qual nos solicitava uma Monografia de um romance picaresco.   À medida que íamos lendo a obra, escolhida “democraticamente”, por cada grupo; íamos mostrando os nossos “alfarrábios” garatujados  ao mestre, para que numa data preestabelecida, fosse apresentada oralmente e, num próximo encontro, fazer-se a entrega do trabalho escrito. E, como num banco de réu estávamos todos, sem exceção, a prestar depoimento de nosso feito. Pois, sim, chegou o meu dia. E para a minha surpresa, vejam  vocês mesmos, qual foi a posição do juiz:
“O esboço apresentado sugere, fortemente, a possibilidade de realização de um trabalho criativo e pertinente.
Os tópicos eleitos para a elaboração da pesquisa indicam que essa leitura detectou um eixo válido ao raciocínio do Galvez pela ótica da neopicaresca.
Aguardo o resultado da reflexão.”
Isto, me fez lembrar o Capitão, não daquele, mas desse do carpe dien, do filme Sociedade dos Poetas Mortos.


ALGUNS CAPÍTULOS: GALVEZ
                                               

                                                                                    “Ficar no aprendido não é ser natural: é ser acadêmico...”
                                                                                                                                                    (Mário de Andrade)


Floresta Latifoliada
Esta é uma história de aventuras onde o herói, no fim, morre na cama da velhice. E quanto ao estilo o leitor há de dizer que finalmente o Amazonas chegou em 1922. Não importa, não se faz mais histórias de aventuras como antigamente. Em 1922 do gregoriano calendário o Amazonas ainda  sublimava o latifoliado parnasianismo que deu dores de cabeça a uma palmeira de Euclides da Cunha. Agora estamos fartos de aventuras  exóticas e mesmo de adjetivos clássicos e é possível dizer que este foi o último aventureiro exótico da planície. Um aventureiro que assistiu às notas de mil réis acederem os charutos e confirmou de cabeça o que a lenda requentou. Depois dele: o turismo multinacional. (pág. 13)

Love and Revolution
Cira não escamoteava absolutamente nada para que eu lutasse pelo seu amor. Enfrentar o imperialismo americano tendo como propelente ideológico o amor de uma mulher. E eu dizia, por favor, querida, isto não é romance do Abade Prévost! Quantas libras esterlinas temos nisso?

Ata
Comitê de defesa do Acre.
Reunidos no Ano da Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo de Mil Oitocentos e Noventa e Oito, às vinte e duas horas e dez minutos no local denominado Usina Velha, na estrada Val-de-Cães, o nosso presidente Dr. João Lúcio de Azevedo deu como aberta a sessão, apresentando o convidado especial, o Dr. Luiz Galvez Rodrigues  de Aria. Pedindo a palavra falou a companheira Sra. Cira Chermont: “A causa que defendemos não pede barreira de nacionalidade. Pede apenas a solidariedade. Lutamos contra a ameaça que pesa sobre o povo do Acre, uma região esquecida e miserável e que se tornou alvo da cobiça internacional.” Pediu uma aparte o companheiro Alberto Leite: “Lutamos contra a criação de uma Corporação Internacional que poderá dominar o Acre. Já existem muitas regiões do globo infelicitadas por esse tipo de empresa. Zamzibar é um exemplo.” A companheira Cira Chermont prosseguiu: “A nossa melhor borracha vem do Acre. Até a metade deste século ninguém discutia a nacionalidade do Acre. Só os índios lá viviam e o Acre era evitado até pelos exploradores mais corajosos. Diziam que por lá havia febre. Os cearenses não tiveram medo da febre e entraram na região. Empurraram a fronteira com a própria miséria...” (pág. 44)

Máxima
Certamente a miséria também é imperialista.

Ata - Continua
“... E quem se beneficiou foi o Brasil. Hoje a borracha...” (pág. 45)

Calderón de la Barca
Me ofereci para organizar uma zarzuela com os sobreviventes. Afinal, eu me sentia de certo modo culpado daquela situação. Entrava no mundo do teatro pela porta do remorso, a porta espanhola. Sir Henry aprovou a idéia e prometeu ajudar. Tinha relações em Manaus, era amigo do proprietário do hotel Cassina, o luxuoso hotel dos aventureiros. Blangis batizou a nova companhia com o nome de “Les Commediens Tropicales”.


Primeira Conferência
“Recusamos sistematicamente a ciência tradicional que teme a imaginação. Queremos uma ciência livre dos entraves do racionalismo judaico-cristão. O misterioso monumento art-nouveau que é o Teatro Amazonas, no Brasil, é um enorme conjunto arquitetônico preciosamente trabalhado, com mais de cem pés de comprimento e pesando milhares de libras.  Foi levantado a novecentas milhas do oceano Atlântico e acima da linha do equador. No alto do monumento há uma intrigante cúpula dourada que coroa o monumento perdido na jungle tropical. Para deslocar apenas esta cúpula, teria sido necessário o esforço de quarenta mil homens. Para nós, este colossal trabalho megalítico tem sua chave nas lendas orais dos nativos, que falam sobre o poderoso “mestre” Jurupari, dominador das mulheres e que teria vindo do espaço, mais precisamente, da constelação da Plêiade. Considerando a impossibilidade técnica da civilização megalítica ter erigido tão complicado monumento no meio da selva, sobre um platô que lembra um porto para veículos do espaço, negamos aos arquitetos do látex, que também não possuem sofisticação tecnológica, o feito dessa realização. O fato de afirmarem que o Teatro Amazonas data de época recente é uma grosseira simplificação de ignorantes. Fizemos testes com resíduos no Instituto de Metafísica Nuclear de Adis-Abeba, que nos revelaram um período de pelo menos um milhão de anos, o que coloca o surgimento do monumento na era Glacial. Em visita ao monumento, há seis meses passados, notamos a existência de diversos corpos no interior do palco. Os corpos estavam mumificados. Mas não se trata de um monumento funerário, mas também não descartamos a hipótese de se tratar de um túmulo cultural. Sem temor, podemos afirmar que há poderes biocósmicos ainda por descobrir. O Teatro Amazonas é para nós o mais perfeito indício da presença de seres extraterrestres na Terra, ao lado das pirâmides do Egito e da megalópolis de Tiahuanaco. O que nos surpreende é a cuidadosa dissimulação de sua real finalidade, e o art-nouveau uma lição de civilização legada por Jurupari, o viajante das Plêiades, que um dia surgiu numa cúpula flamejante e emprenhou as mulheres nativas. (pág. 92, 93 e 94)

Agenda
Organizar um Comitê Revolucionário para preparar as etapas do movimento.
Organizar um serviço de informação para coletar dados sobre a presença boliviana no Acre.
Organizar uma equipe de recrutamento de voluntários.
Organizar uma equipe de intendência e munições.
Alugar uma área para treinamento militar dos elementos recrutados. (pág. 127 e 128)

Oficial General
Galvez - Poderíamos conquistar o mundo se não morressem de cirrose hepática.
Vaez - São o que temos de melhor.
Galvez - Algum problema?
Vaez - Uma baixa. Zequinha Farias, o nosso pianista, morreu ontem na Santa Casa.
Galvez - Causa Mortis?
Vaez - Sífilis!
Galvez - Mande colocar a bandeira a meio-pau! (pág. 130 e 131)

Ordem de Serviço I
Do: Comandante Galvez
Para: Intendente Chefe.
Prezado Senhor, venho por meio desta ordenar um remanejamento em nossas compras. Queria diminuir a munição em quatro caixotes de balas e adicionar duas caixas de vinho e vinte dúzia de cerveja.

Saudações Revolucionárias.
Viva o Acre Independente.
Galvez, Comandante-em-Chefe. (pág. 131)

Théârtre de Beaumarchais I
Enquanto a comitiva se encontrava no saguão, decidi investigar pessoalmente. Ordenei que minhas agentes Marthe, Marie e Concetta  procurassem informações na fonte. Justine L’Amour decidiu trabalhar por conta própria e também acompanhou minhas agentes que imediatamente invadiram o saguão  do hotel, para o contentamento dos funcionários. Entrei no quarto onde estava hospedado Luiz Trucco e roubei uma coleção de mapas. No quarto de Kennedy não encontrei absolutamente nada, estava intocado e mesmo a cama continuava sem lençóis e colcha.


Decreto
O Imperador do Acre, em suas prerrogativas de Soberano e representante da vontade popular, decreta:
§ 1.º - A vigência do Código Penal Brasileiro em todas as suas cláusulas, no território nacional.
§ 2.º - A vigência da Constituição Brasileira em todas as suas cláusulas e na redação atual, no território nacional.
§ 3.º - Este decreto terá validade até a convocação da Assembléia Constituinte do Acre, em futuro próximo.
Cumpra-se e publique-se.
Luiz Galvez Rodrigues de Aria, Imperador do Acre.  (pág. 165)

Bilhete
Sr. Galvez.
Olhe aqui, o senhor anda muito entusiasmado com essa estória de decretos. Pois fique sabendo que não gostei nada de terem me tomado o depósito de mercadorias da praça 15 de Novembro.
Do amigo,
Pedro Paixão. (pág. 167)

Ilustres Desconhecidos IV
O primeiro trabalho do Ministro da Saúde  foi curar o Imperador de uma terrível ressaca. Ele me deu um preparado de guaraná que ainda hoje considero um santo remédio. Revelo aos leitores o segredo do Dr. Nobre:
Guaraná em pó ........................................  5 a 20 gramas.
Piramido  ................................................  10 a 40 gramas.
Para uma cápsula.
Importante: o pó do guaraná  deve ser obtido ralado na língua do pirarucu. (pág. 175)


Diálogos do 3º Mundo II
Galvez - Quais as providências tomadas?
Chefe de Polícia - ...?!
Galvez - As providências, cavalheiro?
Chefe de Polícia - Bem, bem... (bocejo) A vítima não suportou o golpe,  faleceu. Dr. Nobre acusou hemorragia no atestado de óbito. Ela vai pra cadeia. O problema são os filhos.
Galvez - Filhos?
Chefe de Polícia - São onze filhos. O mais velho tem 12 anos.
Galvez - Solte a mulher. Olhe aqui, minha tia, a senhora não pode andar decepando escrotos por aí, ouviu? Vou mandar lhe soltar e trate de cuidar de seus filhos. Audiência encerrada. (pág. 180)

Grand Finale ou Petit Apothéose
Os leitores que me perdoem, mas furtei o passado da alacridade das memórias e da seriedade das autobiografias. Devolvo minhas aventuras como elas sempre foram: um pastiche da literatura em série, tão subsidiária e tão preenchedora do mundo. Reparti minhas sensações nestes capítulos e entrego meus passos ao rodapé imaginário de um jornal. (pág. 195)

A Dialética da Natureza
O nosso herói existiu realmente e pelo norte do Brasil exercitou sua fidalguia. Comandou uma das revoluções acreanas, e quem duvidar que procure um livro sério que confirme nossa afirmação. Os lances picarescos de Luiz Galvez formam um todo com o vaudeville político...  (pág. 196)


ANÁLISE ANATÔMICA DO TEXTO


"O sexo obrigava o dinheiro a ser criativo."
Luiz Galvez (pág. 117)

PRIMEIRO EQUÍVOCO

Sem a mínima intenção de querer fazer comparação e, ao mesmo tempo  fazendo com Machado de Assis;  a primeira impressão que tive ao folhear o livro Galvez:  Imperador do Acre, me lembrou mais que de súbito e imaginariamente, do romance Memórias Póstumas de Brás Cubas ante semelhante fragmentação dos conteúdos de ambos. Agora, percebo que em Machado se tem a segmentação do conteúdo em capítulos, e em Galvez, tem-se apenas quatro capítulos, os quais são fragmentados. E aqui basta, para a minha conclusão precipitadamente equivocada. Pois, onde lê-se capítulos em GALVEZ, lê-se partes  que é o que mais se amolda à sua anatomia.

SEGUNDO EQUÍVOCO

Acredito, que agora já poderei me aventurar e cair de boca, olhos, ouvidos, nariz, mãos nessa fêmea que como uma submissa me espera fechada, mas a depender dos artifícios (pesquisa, leitura, paciência, perseverança e amor) deste amante, ela abrir-se-á como a flor que carece de ser explorada e se deixa ser levada pelas carícias das mãos misteriosa da natureza. Para assim, ele (o amante) poder mergulhar e se perder também nas suas entrelinhas e conhecer-lhe com profundeza a sua intimidade; e, por fim, confirmar o adágio popular de: sou uma obra (literalmente) aberta. Mas há de se fazer  uma ressalva: que o meu espírito de pretenso aventureiro se revista do mesmo espírito aguçado de um Lazarilho de Tormes, de um Guzmán de Alfarache, de um Buscão mesclado da cautela de um Galvez quando diante da sua atraente Cira:
“... e confessava que aquilo me metia medo...” “Agora eu estava certo   de   que   ela   não   era   o   melhor  caminho  para  um aventureiro se  integrar  na sociedade do látex.  Se  era  isso o que eu desejava, deveria ter me livrado dela.”
Digo, portanto, ainda não estou tão certo quanto Galvez, mas que essa obra me instiga a me enveredar por esse tipo de exploração, isto é verdade. Estou receoso. Mas seja o que Deus quiser.

APENAS UMA PERSONAGEM

Então, mãos literalmente à obra. E rumemos à exploração erótica da obra picaresca Galvez:  Imperador do Acre. Quanto ao Imperador, este não me assusta em ter que explorar a sua obra, por se  tratar de uma  personagem apenas, mas que é cúmplice e que sabe muito bem explorar as mulheres dos outros. Por isso estou de consciência tranqüila. Preocupa-me os olhos clínicos da Crítica e  a posição de Márcio Souza, pai da obra. Receio em ser flagrado e sofrer deportação, não como personagem, mas por ser um galucho nessa linha de pensamento.

MIKHAIL BAKHTIN

Em M. Bakhtin vemos que o caminho de um aventureiro geralmente remete às figuras do trapaceiro, do bufão, do bobo os quais têm o objetivo de desmascarar os outros e tornar público a sua vida privada com todos os segredos mais íntimos(1). Com isso, desejo não segredar nada do que a obra,  tem de mais íntimo , sobretudo na esfera sexual e vital para tornar público o que também existe nas entranhas de suas entrelinhas.
Antes de discorrer propriamente sobre a Anatomia Textual, diga-se de passagem, um assunto que muito nos instiga, falarei primeiramente a respeito da Fábula do Galvez: Imperador do Acre,  nossa obra, para ver como a  personagem Galvez, este aventureiro de primeira linha, se tornou pseudo-protagonista de seu autor, escritor brasileiro Márcio Sousa.
Tudo começou quando o autor-personagem em terceira pessoa, este que irá se manifestar dentro da obra ora alertando o leitor das divagações e mentiras do Galvez, ora concordando com as loucuras da personagem; Márcio Sousa? (eu-personagem) turista em Paris, encontrou na prateleira de um sebo do Boulevard Saint Michel um manuscrito redigido em português que constava das aventuras de um aventureiro nas terras da seringueira, que o adquire pela bagatela de trezentos e cinqüenta francos, tendo que enforcar entre outras coisas uma viagem de ônibus a Nice e um jantar no Les Balcans; mas com a intenção de parodiar o mestre de Mecejana, José de Alencar, como o fez no livro GUERRA DOS MASCATES, garantindo portanto, reaver os seus trezentos e cinqüenta francos com o sucesso da sua obra, como podemos atestar nessa análise. A fábula se desenvolve sobre um triângulo de terras que pertencia aos índios amora, arara, canamari e ipuriná que estavam situado entre a Bolívia, Peru e Brasil. Tal pedaço de terras teve como pioneiro um cearense sem trapos que fez uma casinha numa ribanceira de rio,  que ao escrever uma carta em má caligrafia endereçada para o comerciante Visconde de Santo Elias, poderoso comerciante de Belém, ao decifrar a origem da carta como sendo Acre acabava de fazer bons negócios com o cearense e sem saber, batizava aquele território. Já a personagem, Galvez, é um homem de meia idade que aos trinta e nove anos procura se aventurar pelas terras do norte do Brasil. Morando no Rio de Janeiro e, trabalhando como escriturário numa firma, é convencido por Maldonado, um biscainho de Bilbao, que havia ficado milionário no Amazonas. Não muito demora Galvez chega em Belém com o seu projeto mais realista que é o de ficar rico. Na terra do látex entrega-se às mais extravagantes aventuras e por seus caminhos, os mais tortuosos, galga os degraus da vida e chega ao seu objetivo pelos lapsos e percalços do destino. Torna-se amigo de Luiz Trucco, representante da Bolívia, da forma mais esdrúxula que se possa imaginar. Aventurava-se com uma caboca quando no ápice dos deleites que só uma priprioca pode proporcionar é flagrado pelo   português, marido da caboca. Subitamente como um gatuno, salta por uma janela do quarto no qual se encontrava e cai sobre a sua felicidade, ou melhor, sobre quatro homens que ali se encontravam. Era Luiz Trucco que estava sendo abordado por três homens encapuzados  que tentavam roubar-lhe o dinheiro. O acaso faz surpreender os assaltantes que logo fogem e Trucco agradece o feliz ensejo.  Galvez ainda a segurar as calças não compreende bem quando o inusitado amigo o agradece e o convida para tomar uma bebida. Dias após Galvez é convidado a jantar na casa de Trucco e daí então começa a freqüentar a mais alta burguesia paraense, com direito a festas na casa do  prefeito  e até  na


(1) BAKHTIN, Mikhail. Questão de literatura e de estética: A teoria do romance, SP: HUCITEC, 1993. pp 275-281.
 casa do governador. Arruma trabalho no jornal A Província do Pará por intermédio de João Lúcio. Passa a ser integrante do Comitê de Defesa do Acre onde Galvez vê com bons olhos os comentários que são feitos do Acre, mormente no que se refere à riqueza por lá existente e que os americanos têm muito interesse, mas que está sobre o domínio dos bolivianos. A vida de Galvez começa a se complicar quando a Província do Pará publica uma matéria de um documento oficial do governo sobre a qual tinha por trás a participação direta de Galvez  e  de  João Lúcio,  secretário do  jornal;   tal    matéria   deixa   Trucco  sentindo-se traído e o governador Paes de Carvalho furiosos. A mando do governador a polícia fecha o jornal e João Lúcio é preso e brutalmente espancado. Galvez só toma pé da situação quando no Teatro da Paz assistia a temperada lírica. Há um princípio de grande  rebuliço. É a polícia à procura de Galvez que ao perceber foge pelo meio da multidão agitada. Foge para o porto e clandestinamente pega carona num vapor que segue o Rio Amazonas com destino a Manaus. Quando já bem acomodado é descoberto por uma freira, esta que não vamos tecer nenhum comentário pelo menos agora, deixemos para quando estiver na Anatomia Textual que esta personagem é de suma importância para a nossa análise. Galvez é visto como uma coisa demoníaca dentro daquele barco e é expulso pelo bispo de Belém e abandonado às margens do Rio Amazonas. E como num sonho Galvez é salvo pelo vapor de bandeira inglesa do cientista Sir Henry Lust que se destinava para Manaus. Chegando em Manaus aumentam as suas chances de ir para o Acre e a mesma freira que o flagrou no barco é quem o faz despertar seu interesse, quando lhe conta da fortuna que o governo do Amazonas coloca à disposição dos interessados  a  se habilitar em liderar um movimento em nome da libertação do Acre que está nas mãos dos bolivianos,  apoiados pelos norte-americanos, isto é, para que seja declarado independente aquele território, com o objetivo de formar um governo que tenha o seu reconhecimento internacional. A freira o convida para uma reunião e sem hesitar Galvez aceita o convite. Quando na reunião Galvez vê o prêmio de cinqüenta mil libras e não resiste. Aceita o desafio e se faz líder de um grupo de estudantes eternos, vagabundos crônicos, poetas inéditos, ovelhas negras de boas famílias, advogados chicanistas e parte para o Acre. Lá chegando, hospeda-se na casa do proprietário, coronel Pedro Paixão que só adere a revolução depois que é homenageado com uma grande festa articulada pelos assessores do Marechal-de-campo Luiz Galvez Rodrigues de Aria. No dia 14 de julho de 1899, dá-se a queda de Puerto Alonso, às sete horas da manhã quando os bolivianos ainda dormindo são pegos de surpresas e presos sem muita resistência. Em seguida Galvez se faz Imperador. Prende o representante boliviano Luiz Trucco e o hipocondríaco americano Michael Kennedy. Então Imperador do Acre Galvez perde as rédeas de seu governo e dar lugar às extravagâncias: orgias e mais orgias, prostituição, escândalos e depravação invadem o recém-território e começa a incomodar conservadores como Dona Vitória, mulher de Pedro Paixão, que em seus encontros religiosos deixa bem clara a sua insatisfação e revolta, e chega a tramar a queda do Imperador Galvez, com o seu slogan: abaixo o can-can. Quando também surge a figura do tenente Burlamaqui que  andava insatisfeito até com o governo brasileiro, imaginem com o Imperador do Acre. E quando tudo tramado, no dia 31 de dezembro de 1899, às nove horas o tenente Burlamaqui  entra no palácio, que estava em festa, à procura de Galvez  para depor-lhe pessoalmente, e o encontra dormindo  entre várias garrafas de seu famoso xerez, protegido pela escuridão do caramanchão. É preso sem oferecer nenhuma resistência. E poderia no estado em que se encontrava?
Podemos encontrar no romance Galvez um precioso universo de intertextualidade que nos faz retornar a leituras feitas em nosso dia a dia de maneira formal ou informalmente, como também nos convida a fazer outras leituras com obras que, às vezes, só ouvimos falar. Assim como, especificamente, obras e autores como José de Alencar (Guerra dos Mascates), Cervantes, Robson Crosué, Flaubert,
 Julles Verne, Gulliver, Molière, Anatole France que aparecem de forma fragmentada dentro da obra. São
referências que nos instigam a procurar nos aprofundarmos, no futuro, assim como também amplia o nosso repertório, eliminando, mesmo que por alguns miríficos instantes, a nossa fome de leituras e de conhecimento, descobrindo portanto que, Flaubert, precursor realista, é detalhista e minucioso demais em seu romance Madame Bovary. Honrando portanto, com a estética da época: o Realismo.
Para iniciarmos este fragmento, acreditamos que  tudo tem a ver com o tema SINAL VERDE(?) o qual serve de abertura à primeira parte desta nossa análise. Mas vamos ao que realmente nos interessa. A carona que pegamos, é no que tange à intertextualidade de que trata o tema anterior que fala de leituras de outrora e nos fez lembrar dum livro dos críticos literários Platão e Fiorin PARA ENTENDER O TEXTO Leitura e redação, editado em São Paulo no ano de 1991 pela editora Ática; onde destacaremos dois assuntos que nos situa com precisão, ao que trata com muita sutileza, a nossa musa inspiradora que é a obra Galvez. Façamos destes dois assuntos, dois breves fragmentos da nossa inacabável intenção (anatomia textual):

1 -“AS RELAÇÕES ENTRE TEXTOS” (pág. 19) “Com muita freqüência um texto retoma passagens de outro. Quando um texto de caráter científico cita outros textos, isso é feito de maneira explícita”  ( abrimos parênteses literalmente ou “sem querer interromper e interrompendo” para destacarmos algumas passagens dentro da obra, Galvez, que contrariando o que estabelece Platão e Fiorin, apresenta dados científicos de forma implícita. Por exemplo: “O rio Amazonas como rio de planície, possui uma correnteza vagarosa e cria sinuosas trajetórias. É a maior bacia hidrográfica do mundo e a única  que  não  legou  nenhuma  civilização importante para a história da humanidade.” “Há 35.000 utilidades para o uso da borracha, e, no entanto, segundo Henry Ford, - atenção, para um detalhe importantíssimo nesse fragmento que se insere numa obra de ficção e nem mesmo assim o personagem não se furta em fazer citação de uma pessoa importante e que conhece, com certeza, as qualidades da borracha. Como aprendemos em Língua portuguesa II, para endossar e reforçar nosso discurso fazemos o uso de citação ou argumento de autoridade que seja experta no assunto em pauta - ela ainda permanece na infância da indústria.” Diz Galvez. Bom, poderíamos dissecar os trechos referentes aos dados científicos existentes em nossa obra, mas não é o caso, fiquemos em sua anatomia apenas). Platão e Fiorin nos explica o porquê da atitude do escritor, que para nós, é Márcio Souza e não personagem como falamos ainda pouco. Dizem, os críticos acima: “Num texto literário, a citação de outros textos é implícita, ou seja, um poeta ou romancista não indica o autor e a obra donde retira as passagens citadas, pois pressupõe que o leitor compartilhe com ele um mesmo conjunto de informações a respeito das obras que compõem um determinado universo cultural. Os dados a respeito dos textos literários, mitológicos, históricos são necessários, muitas vezes, para compreensão global de um texto.”
2 - “O TEXTO E SUAS RELAÇÕES COM A HISTÓRIA” (pág. 27). Antes de tratarmos deste assunto, façamos um retorno ao início da nossa obra e destaquemos o que diz na sua apresentação: Este  é um livro  de ficção  onde figuras da história se entrelaçam numa síntese dos delírios da monocultura. Bom, aqui basta-nos para que convidemos, mais uma vez e última, Platão e Fiorin para exprimirem descritivamente sobre esse assunto: “... todo texto é um pronunciamento sobre uma dada realidade. Ao fazer esse pronunciamento, o produtor do texto trabalha com as idéias de seu tempo e da sociedade em que vive. Com efeito, as concepções, as idéias, as crenças, os valores não são tirados do nada, mas surgem das condições de existência.” “Todo texto assimila as idéias da sociedade da época em que foi produzido.” “Quando se afirma que os textos se relacionam com a história, não se quer dizer que eles narram fatos históricos de um país (propriamente), mas que revelam os ideais, as concepções, os anseios e os temores de um povo numa determinada época.” Retomemos parte da apresentação da nossa obra: Os eventos do passado estão arranjados numa nova atribuição de motivos e o autor procurou mostrar uma determinada fração do viver regional.


NARRATIVA DENTRO DA NARRATIVA


“Não sendo a criatividade um fruto do academicismo, nas universidades ela demora a prosperar”
(paródia da epígrafe da parte 3 - Galvez – por MC Garcia)


PSEUDO-NARRADOR

Nesta análise,  Galvez: Imperador do Acre, não se pode dizer o mesmo que disse Mário González em análise de O Guzmán quando lembrava a nós leitores da existência do Larazilho. Digo, isto no que se refere à vida de um pícaro como um clássico. Porque em Galvez se percebe um certo distanciamento do qual faz parte do processo de evolução que sofre o romance picaresco onde se pode ver esse processo no próprio estudo dos pícaros apresentado por Mário González. Percebe-se portanto, que a abertura que esta modalidade deixa para se criar e se tomar outras direções na linha do picaresco é muito propícia e  acima de tudo louvável para quem assim desejar segui-la; ao ponto de se ter hoje uma nova denominação dessa modalidade de romance: o romance neopicaresco, o qual tem a sua eclosão no século XX, especificamente na América Latina, manifestando-se praticamente no Brasil nos dias atuais, como nos confirma mais uma vez M. González. Podemos assim destacar obras como Memórias de um Sargento de Milícias, de Manoel Antônio de Almeida, obra que segue as linhas do pícaro clássico (ou como  caracteriza Antônio Cândido em Dialética da Malandragem, de Romance Malandro), mas que tem a sua identidade própria, por exemplo, no tipo de narrador apresentado que é em terceira pessoa e não em primeira como é de costume; Macunaíma, de Mário de Andrade, este é um romance que segue características bem próprias que chega a extrapolar as linhas do pícaro espanhol, se assim podemos dizer, e passa a ser um romance autenticamente brasileiro, graças a modalidade neopicaresca. Macunaíma transgride e subverte a "forma" até do que é picaresco, por isso se insere na modalidade neopicaresca.
No que se refere ao narrador em nossa obra, há de se fazer alguns esclarecimentos específicos. Ainda, quando na fábula tratei de um narrador em terceira pessoa equivocadamente, pois em se tratando também de uma exploração minuciosa, descobri nas entranhas das entrelinhas da obra, no seu íntimo, na sua essência que se camuflava um pseudo-narrador em terceira pessoa, quando na verdade existem dois tipos de narradores: um é aquele que se faz fiel às características de um narrador clássico, isto é, como pícaro que narra a sua própria história, em primeira pessoa, para se tornar narrador-protagonista, nos levando, como leitores à mirífica deleitura, fazendo que divaguemos em seus sonhos de saudosista incurável e muitas das vezes mendaz. Aí, é quando entra o outro tipo de narrador, o narrador implícito, o narrador intruso que quer porque quer tomar parte na narrativa pegando carona chamando a atenção do narrador principal; este segundo tipo de narrador é aquele que só tem relevância na narrativa quando se propõe no início a narrar sobre o romance Galvez o qual por mera obra do destino, como um autêntico pícaro encontra num sebo em Paris, em rascunho, as aventuras de um velho de Cádiz, na Espanha. Portanto, ficamos diante de dois personagens, dois narradores que não se sabe definir bem quem realmente está com a verdade, se o narrador-protagonista, ou se o narrador-caronista que possui um certo teor de onisciência dentro da obra.


 O PÍCARO COME BEM MAS TEM FOME...

 “Deu de Deo”
Miguel de Cervantes.

“ANTROPOFAGIA”

O que dissertarei agora, revelará sobre um aspecto “humanamente” Modernista, do qual Oswald de Andrade propôs em seu manifesto Antropofágico em maio de 1928: “Só a antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente.” (1) Mas para que isto aconteça, recorro ao recurso da Literatura Comparada para fazer uso de duas obras (Galvez, esta que já é de nosso conhecimento e Juramento, conto de Humberto de Campos) as quais nos revelarão a que nível atinge a fome humana, isto é, sem medir o grau de socialização ou civilização, como muitos (homens) acreditam que isto valha alguma coisa para ser social. Sigamos adiante para verificar.
Falarei de Humberto de Campos, deste que ainda não nos é do nosso conhecimento, mas que agora passa a ser; Humberto de Campos é maranhense, escritor, contista, cronista  e, é só o que sabemos dele no momento, mas com certeza, ele vai estar na  bibliografia deste estudo para aqueles que quiserem se deleitar de seus miríficos contos assim como O Monstro e Juramento. Este último, é o que nos vai servir de referência para o estudo comparado com a obra Galvez: Imperador do Acre, essa  amiga que já se tornou tão íntima da gente e que a cada instante desvendo prazeres inusitados em adentrar mais e mais nas suas complexas entranhas de feminina, impossíveis de serem exploradas por completo, justamente por dois motivos: primeiro pelo tempo que me é escasso; e segundo, pela volubilidade de estar sempre a flertar outras obras, pois me sinto altruísta e, é assim, que todo estudo teria que ser. Eis o parâmetro entre os dois textos: Galvez x Juramento. Observemos a marca de paradoxo que existe nas atitudes das duas personagens abaixo:
Ramon Gonzalez:  “...E começava a entardecer, quando fomos assaltados pelos índios xurupinás, que são os mais terríveis de toda a região.”
Galvez de Aria: “Senti um frio quando descobri que eram selvagens. Eu tinha me escondido numa árvore bem alta e vi umas dez ubás lotadas de índios exageradamente felizes com padres e freiras.”
Ramon Gonzalez: “Presos, manietados com cipós, fomos conduzidos ao acampamento dos indígenas, sete léguas adiante, mato a dentro...”
Galvez de Aria: “As vítimas foram amarradas em troncos, por uma corda...” “...os selvagens ofereceram tacapes para que pudessem se defender. Não aceitaram, e foi com indignação que fizeram saltar os santos miolos em golpes de mestre.”
Ramon Gonzalez: “ - Antropófagos, os xurupinás devoraram, nesse mesmo dia, os dois homens da condução. No dia seguinte, pela manhã, comeram o meu amigo. Restávamos eu e Consuelo.” “- Consuelo era linda e forte. Vi quando a mataram, com uma pancada vigorosa no crânio... Como são feios os miolos,  aparecendo, ensangüentados, entre a pasta


(1)ANDRADE, oswald de. O pensamento vivo de. Martin Claret, edições ilustradas. pp. 10-11
dos cabelos!... Impassível, como num sonho, eu via tudo. E só despertei do meu pasmo, quando um dos índios, o chefe, que tostava o seu pedaço na fogueira fumarenta de gordura, me veio perguntar, em um gesto, que pedaço eu queria. Olhei as postas de carne fria,  sôbre as quais as môscas  zumbiam, com fúria: a mão miúda, de dedos contraídos,   em  um  dos
  quais estava,  ainda,  um   anel  que  lhe  dera;  um  dos   pés,   meio devorado e  com as  cartilagens  penduradas;  as  entranhas,  a cabeça quasi esfacelada, pendurada a um esteio pelos cabelos; a sua perna; a sua coxa; um dos seus braços, o mais lindo que tenho visto... Indiquei um pedaço de carne roxa, que
aparecia, repugnante, entre vísceras, o qual me foi trazido, e que eu comecei, também, a devorar.”
Galvez de Aria: “Os corpos foram imediatamente despidos e desmembrados. Sem nenhum tempero visível, foram colocados para assar.” “Vi quando os selvagens amarraram uma freira numa árvore e praticaram tiro-ao-alvo com flechas. Era Joana.” “Os ingás não me haviam enchido o estômago e aquele odor adocicado de assado era tentador. Não quero chocar ninguém e não sei se participaria do banquete, se convidado, mas que a fome era forte, isso não duvidem.”
Já perceberam o que se caracteriza de paradoxo? Pois bem, eis o que prometi. Agora em pauta. Perceberam o comportamento final das duas personagens, como se assemelham àquilo que chamamos de civilização e socialização que os homens sempre priorizaram ante o comportamento silvícola de um indígena? Ambas as personagens, mesmo com identidades de civilizados, não se furtam da possibilidade de se transformarem em antropófagos, apesar de termos em Galvez uma atitude reflexiva, não descarta o prazer de saborear o prato indígena por causa da fome que corrói o seu estômago, mas há a impossibilidade do convite; já no conto juramento, porém, de Humberto de Campos, a personagem, Ramon Gonzalez, é convidada a partilhar do banquete silvestre e faz-se como todos nós, um autêntico antropófago, com identidade e tudo mais..., como assim sugere Oswald de Andrade.
Agora é verdade, e eu já não estava mais agüentando também. Aqui vou começar a aventura da qual me propus no início deste estudo. Bom, antes que não me esqueça, vou lembrar do que realmente irei tratar especificamente. Primeiro falarei das aventuras eróticas que existem na obra, em que vai aparecer aquela personagem do barco que flagrou a nossa Personagem.  Chamarei este primeiro assunto de Análise Anatômica Textual;  em segundo, falarei das fomes do nosso pícaro, quando em negrito dei destaque à sentença: COMIA BEM.
Eis a ANÁLISE ANATÔMICA TEXTUAL tão esperada  da qual irei discorrer precisamente no que existe de mais erótico na obra, que na verdade não é nada mais nada menos do que os “atos” sexuais do nosso aventureiro Galvez, que se totalizam em número de onze, isto é, são os que pude identificar num primeiro momento; sendo que, sete deles são “reais” e quatro não passam de divagações de um eterno saudosista exilado que, para escapar da solidão, nos dá um universo fictício de sua própria vida de ficção; onde já ingresso na então idade do lobo, como costumam dizer, a faixa dos 40, também já apresenta o seu declínio sexual em virtude do consumo de bebidas. Para ser mais preciso, relaciono alguns desses momentos tão relevantes para o homem e para  Galvez no que alude ao sexo, às suas relações sexuais com a caboca paraense, mulher do embarcadiço português; com Cira, mulher de um negociante de madeira; Joana, a freira, esta que se fez  noiva de Cristo e  que não era mais virgem e que terminou transando com Galvez.   Eis a  importância  que a  personagem  tem nessa análise, quando  recusei-me de tecer qualquer comentário sobre a mesma na fábula. Na verdade há uma crítica à igreja católica, onde mostra a insatisfação de Joana,  totalmente despreparada, sem nenhum dom para seguir a vida religiosa, isto é, como irmã de Cristo; Dona Irene, mulher do prefeito de Belém, crítica social no âmbito da política;  menina de aproximadamente doze anos, exploração sexual de menores; a vendedora de fósforo de dezessete anos; e Justine da companhia de dança, a qual Galvez pode contar nos seus momentos mais difíceis, principalmente, quando se fingiu de morto e viajava de Manaus para o Acre dentro de um caixão e Michael Kennedy flagra Justine em cima do caixão trepando com o morto. Estes “fatos” eróticos ocorreram nas capitais da seringueira. Agora, os “fatos” da Duquesa Theresse, mulher do marido sifilítico; Bianca, a Princesa Toscana, mulher do marquês que é “corneado” também por um Bispo; Agnes Louise, mulher do marido que sofria convulsões; e por fim, Maria Isabel que foi desonrada por Galvez que tirou e fez derramar sangue daquela família por duas vezes: Maria por ser desvirginada e o irmão por ser morto pela espada de Galvez. Esses, ensejos, são passagens que constam nas digressões, ou melhor dizendo, nas divagações sofridas constantemente por Galvez.
Entrarei agora nas fomes propriamente dita que o nosso herói sofria para falar da sentença em destaque: COMIA BEM. E comia bem mesmo a personagem. Digo, comia e nunca que saciava a sua fome, como nenhum outro homem  terá jamais que deixar de sentir as fomes do nosso herói. Porque todos
nós sofremos de alguma dessas benditas fomes que é a fome de poder, de sexo, de bebida, de viver e, acrescentaria mais umas, que especificamente são a fome do Saber, do Conhecimento e da Pesquisa na ânsia de enriquecer esse estudo.
Cônscio de que esse é um trabalho árduo centrado na pesquisa,  que  exige um esforço fora do normal e que, acima de tudo, o tempo é escasso mas exige que se desvende algo inusitado a cada passo que se siga, motivado pelo anseio da análise e do espírito da criação, que são o   processo desse desejo que se  flui, nesses miríficos ensejos dessa Análise Anatômica textual que se desenvolve a mil, num arrebatamento que me aguça os sentidos  e me tranqüiliza a alma, a me fazer sentir, às vezes,  um autêntico personagem de obra de ficção, a divagar como assim o fez Galvez,  vejo-me metamorfoseado    num verdadeiro nefelibata do Romantismo. E, desta feita, o narrador intruso, entrão após nos alertar, por diversas vezes, das divagações da personagem, termina se convencendo de que o sonho, o saudosismo, as pseudo-verdades fazem parte da vida, tanto da obra, como da personagem. Eis a conclusão daquele narrador:
“Interrompo  para advertir que o nosso herói vem abusando sistematicamente da imaginação, desde que chegou de Manaus. E como sabe nos envolver! Para início de conversa, no Acre ele tentou organizar um República liberal. E depois, bem, depois, pensando melhor, para que desviar o leitor da fantasia?”   (está no segundo fragmento da nossa obra intitulado Perdão, Leitores - pág. 176).
Olhos atentos para as sentenças em negrito e concluamos o comportamento do narrador intrometido e vencido.
Chego até aqui e só Deus sabe como. Mas, mesmo assim, valeu! sinto-me com  uma estranha sensação de vazio. Um eterno vazio de fome da mesma maneira em que iniciei esse estudo, fome de Conhecimento, pelo tempo, pela inexperiência, pela ingenuidade e pela ousadia,  que me foi sentida  a cada linha, a cada parágrafo, dessa análise na qual procurei concluir, mas não consegui;  eis que uma fome me  obriga a procurar insaciavelmente leituras e mais leituras para que atenda as minhas necessidades de acadêmicos eternos? Isto é,  se não me transformar   num   pícaro   de   “Futuro infinito”   para  que me aventure em leituras, mesmo que seja num visionário Dom Quixote, na intenção de matar nunca, mas de ficar sempre com essa atiçada  fome quase que crônica do Saber da crítica literária, na ilusão de que só através da pesquisa interminável é que irei atenuar essa minha fome? Talvez ainda nem assim.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ALMEIDA, Manoel Antônio de. memórias de um sargento de milícias. Ed. crítica de  Cecília de Lara.   RJ: Livros  Técnicos e  Científicos, 1978 (Biblioteca  Universal de  Literatura Brasileira,2)
ANDRADE, Mário de. aspecto da literatura brasileira. 6a. ed. São Paulo: Martins, 1978.
ANDRADE, Mário de. macunaíma: o herói sem nenhum caráter. Ed. crítica de  Telê Porto Ancona Lopez. Paris: Association Archives de la Litérature latino- américane;  Brasília: CNPq, 1988 (arquivo, 6)
ASSIS, Machado de. memórias póstumas de Brás Cubas, Ed. América do Sul LDA, Chile, 1988 ( Biblioteca de Ouro da Literatura Universal )
BAKHTIN, Mikhail. Funções do trapaceiro, do bufão e do bobo no romance. Em seu questão de literatura e estética: A teoria do romance. 3ed. Trad. Aurora Fornori Bernardini et alii. SP: HUCITEC, 1993. pp 275-281.
CAMPOS, Humberto de. o monstro e outros contos. Ed. W. M. JACKSON INC. SP/ RJ/RS: 1947.  (vol. 25) pp 163-172.
CARVALHO NETO, Paulo de. meu tio Atahualpa. Trad. Remy Gorga Filho. SP: Círculo do Livro, 1976.
CERVANTES, Miguel de Saavedra. dom quixote de la mancha. Trad. Viscondes de Castilho e Azeredo. SP: Abril Cultural, 1981.
FIORIN, José Luiz. & SAVIOLI, Francisco Platão. para entender o texto: Leitura e redação. 3ed. SP: Ática, 1991.
GONZÁLEZ, Mário M. o romance picaresco. SP: Ática, 1988, ( Princípios, 151 )
MARANHÃO, Haroldo.  o tetraneto del rei (o torto suas idas e vindas ) RJ: Francisco Alves, 1982.
OS PENSADORES. Sócrates. Trad. Jaime Bruna, Líbero Rangel e Gilda Maria Reale. SP: Nova Cultural, 1996.
QUEVEDO, Francisco de. o gatuno: história da vida do gatuno chama  do Dom Pablos, exemplo de vagabundos e espelho  de  velhacos.  Trad.  Eliane Zagury. SP: Global, 1985 (Armazém do Tempo)
REVISTA DO INSTITUTO DE ESTUDOS BRASILEIROS, dialética da malandragem. USP, nº8, 1970, pp. 65 a 89.
SOUZA, Márcio. galvez: imperador do acre. 10ed. RJ: Marco Zero, 1983.
SUASSUNA, Ariano. A pedra do reino: romance armorial-popular brasileiro.  RJ: J. Olympio, 1971.
VIDA DE LAZARILHO DE TORMES, A. Trad. Stella Leonardos; Intr. Adriano da Gama Kury. RJ: ALHAMBRA, 1984.



Natal, 02 de Março de 1999.

Maurício C. Garcia - autor
MC GARCIA